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04/11/2015

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Personagem viva da História, Nanette B. Konig contou sobre a experiência de ter sobrevivido ao Holocausto e escapado da morte após sofrer diversas brutalidades. Ela ainda alertou sobre os perigos que a falta de informação e conscientização podem trazer a toda uma sociedade. “Sem conhecimento as pessoas são facilmente manipuláveis”  

 

A ação de realizar projetos e eventos que signifiquem em crescimento e aprendizado é também uma das bandeiras do CPP-Limeira, devido a isso a entidade realizou, na tarde desta última terça-feira (03) no salão social da sede de campo, uma palestra com Nanette Blitz Konig, que sobreviveu ao Holocausto.

Ela, uma holandesa de 86 anos e que desde a década de 50 vive no Brasil, é uma personagem viva da História. Passou pelo drama de perder os pais e o irmão durante o Holocausto – designação dada ao acontecimento que eliminou e tratou com diferença milhões de pessoas em ação arquitetada pelo governo nazista de Adolf Hitler que perseguiu judeus anos antes e também durante a Segunda Guerra Mundial. Embora a imensa maioria dos que sofreram com o ocorrido fossem os judeus, ciganos, homossexuais, deficientes físicos e mentais, entre outros, igualmente foram perseguidos e mortos pelo nazismo – Nanette sobreviveu e, num ato de conscientização e também de alerta, ministra palestras nas quais não somente aborda a experiência pessoal de ter passado pelo que passou, ela também, amparada por pesquisas e dados, procura ensinar mais sobre o Holocausto e afirma: “As pesquisas de hoje mostram que morreram bem mais do que seis milhões de judeus, porque aqueles que morreram depois que a Alemanha invadiu a Rússia, jamais foram registrados, hoje se fala em algo em torno de 7,5 milhões ou nove milhões”, disse.

A holandesa faz esse trabalho há 16 anos no qual tem como foco principal estudantes. “Dou essas palestras porque acredito que seja importante falar sobre isso, é um trabalho que precisa ser realizado”, afirmou. Um dos conceitos principais do ensino e estudo de História é o fato de saber sobre eventos passados e, na medida do possível, aprender com eles. Tal aprendizado também serve para que experiências malsucedidas e catastróficas possam ser evitadas no futuro. Nanette, com seu empenho, colabora em muito para esta concepção. 

Os estudantes, maioria do público presente, tiveram uma oportunidade de muito valor, ouvir de alguém que presenciou de perto o drama e vive até hoje para poder contar. Professores, associados e demais pessoas que se interessaram pela palestra, formaram o público que acompanhou a explanação. Cerca de 200 pessoas estiveram presentes.

Nanette abordou sua infância, no qual, segundo conta, foi um período feliz. A palestrante traçou o Holocausto desde as raízes, ainda no fim da Primeira Guerra Mundial, passando pelo início do mesmo e deu os detalhes que viu e viveu na pele.

Logo no início da fala, abordou sobre quando Hitler alcançou o poder. “Hitler foi eleito democraticamente. Destruiu leis e fez outras que o permitiriam fazer com os judeus o que ele bem entendia”, declarou. “Tive uma infância feliz. Frequentei uma escola pública em que aprendi quatro línguas. Então não reclamem quando vocês têm que aprender uma”, afirmou Nanette, ao mesmo tempo em que olhou os estudantes com mais ênfase em afirmação aconselhadora.

Ela deu detalhes do tempo em que ficou em Bergen-Belsen na Alemanha. “Em Bergen-Belsen não era exatamente um campo de extermínio, mas as condições eram tão deploráveis que muitos morreram de fome, doenças e maus-tratos. A vida no campo era uma constante luta pela sobrevivência. Tínhamos muitos piolhos nos cabelos e nas roupas, isso, mais tarde, me ocasionou a doença de Tifo. Comida em si, não tinha. Uma vez nos serviram um caldeirão cheio de mexilhões, mas não comi, pois tinha medo da maldade dos alemães. Em geral judeus não comem frutos do mar e os alemães queriam nos envenenar, pois estávamos famintos e iríamos comer qualquer coisa. Foram muitas brutalidades. Algo que era incompreensível. Ficávamos horas a fio em pé para nos testarem. Uma vez, já no fim da guerra, fui buscar água. Houve então uma ameaça de vida. Me tiraram da fileira e um soldado apontou a arma para mim. Eu já estava tão indiferente que pensei ‘se quer me matar, que seja’, ele atirou ao ar. Talvez essa indiferença me salvou a vida porque tirei dele o prazer de me matar”, afirmou.

Nanette conta que em dezembro de 1944 chegou Anne Frank em Bergen-Belsen. Anne Frank foi uma menina alemã de origem judaica, que morreu no período do Holocausto. Anne Frank ficou mundialmente conhecida após vir a público o diário que escrevia, em que, entre outros relatos, descreveu o período que viveu escondida com a família em um quarto secreto durante a ocupação alemã na Holanda, no tempo do Holocausto. Anne, segundo consta, mudou-se com a família para a Holanda logo nos primeiros atos do Holocausto. Porém o ódio dos alemães aos judeus era tamanho que outros países começaram a ser invadidos em busca de eliminá-los, um deles foi a Holanda.

Ela comentou sobre os destinos que tiveram seu pai, mãe e irmão. “Logo depois que o meu pai morreu, meu irmão foi deportado em 4 de dezembro de 1944 e um dia depois minha mãe. Não sei o que aconteceu com meu irmão, deve ter morrido no transporte junto com os outros. Minha mãe morreu em uma outra embarcação que transportou muitas mulheres. Esse transporte provavelmente as levariam à Suécia. Ela morreu cinco dias depois da partida do trem”, contou.

Nanette finalizou a palestra falando sobre a intolerância e ignorância, que, segundo ela, foram pilares principais do Holocausto. “Quando às vezes eu sou convidada no Consulado Alemão, eles me falam que não entendem o que aconteceu e eu falo com eles, digo que a Alemanha era considerada um país de cultura, porém essa cultura só era acessível a uma pequena faixa da população. Nem todos tinham acesso aos livros, à música, entre outros. Nos que não tinham essas informações, Hitler fez uma lavagem cerebral e fez deles pessoas que tinham absoluta certeza do que estavam fazendo. Para eles, aquilo tudo estava certo e eles obedeciam. Essas pessoas eram ignorantes e essa ignorância é um tremendo perigo. Pessoas assim são facilmente manipuláveis. A minha história como a de muitos outros mostra que num regime totalitário não há possibilidade de respeito, tolerância e cuidado aos direitos humanos. Com as barbaridades, o medo tomou conta da Europa tomada pelas ocupações nazistas e ficou com medo de agir. A pequena minoria que tomou uma atitude de ajudar os judeus demonstrou muita coragem, alguns foram presos, deportados, fuzilados. Merecem nossos agradecimentos para sempre. Não basta dizer ‘nunca mais’, devemos ser conscientes das circunstâncias econômicas e sociais que foram as principais causas do Holocausto e reconhecer os sinais de perigo antes que seja tarde demais para agir. O preço da liberdade é a constante vigilância. Obrigado”, finalizou Nanette Blitz Konig que após a palavra respondeu perguntas do público e apresentou alguns slides com mais detalhes. Um dos slides mostrou a estrela de Davi que Nanette teve que usar nas vestimentas, pois o governo alemão identificava os judeus com esse símbolo junto ao corpo. 

Dora Arcaro (diretora do CPP-Limeira) e Farid Zaine (vice-diretor), em nome do CPP-Limeira, nos momentos finais do evento, agradeceram a atenção de Nanette para com a entidade e pela palestra apresentada e também pela presença do público. “Não achei que viessem tantos estudantes, valeu muito a pena. Agradeço a presença de todos aqui”, disse Dora Arcaro.        

Houve ainda um espaço, após a palestra, para que o livro de autoria de Nanette, “Eu Sobrevivi Ao Holocausto”, lançado em julho deste ano pela editora Universo dos Livros, fosse vendido. A autora da obra, atenciosamente, ainda atendeu a todos que queriam um autógrafo no exemplar do livro e tirou fotos.

O tempo jamais apagará as tristes lembranças de Nanette Blitz Konig, porém fez reduzir as angústias e ela, ainda que com dor, pôde continuar a viver. O tempo possibilitou também a oportunidade de trilhar um novo caminho, ela se casou e veio morar no Brasil, teve filhos.

O tempo ainda nos mostra que, se nos esforçarmos, podemos tirar lições de fatos lamentáveis, por mais dolorosos que sejam. 

 

CONFIRA ALGUMAS FOTOS DO EVENTO

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*Crédito das imagens: Comunicação CPP-Limeira